domingo, 19 de agosto de 2007

Vinte anos, diariamente

Foto: Carlos Peixoto/G1

Vejo-te como jamais vi meu avô:
a grande calva por trás dos óculos
o rosto marcado
o corpo franzino
a voz grave e rouca
a contar histórias
de fazer passar a noite
e trazer o sol
.
Vejo-te como jamais vi nenhum herói:
sem capa, nem superpoderes
voavas tão alto
no bojo das palavras
que pinçavas, magicamente
- não do dicionário-
mas de dentro
de ti
.
Vejo-te como jamais vi nenhuma estátua:
impávida presença
solidão perpetrada
em bronze
ora afago, ora flor
da cidade que escolhestes
escrever no mar
.
Vejo-te como jamais vi nenhum poeta:
distraído ou concentrado
enquanto revolves os áporos
de minha existência
antieuclidiana, uma flor
verde-pálida pergunta:
como foi que arrancaste daqui,
do meu peito
tudo o que colocaste aí,
no branco papel
de toda a tua vida?


No dia 17 de agosto registrou-se o vigésimo aniversário da morte do poeta Carlos Drummond de Andrade. O texto acima é meu pequeno tributo a quem foi tão universal ao falar de sua própria cidadezinha, Itabira do Mato Dentro, ou tão grande e abrangente ao exteriorizar os seus próprios sentimentos.

15 comentários:

Eliana Tavares disse...

Bom Dia Adão Flehr!!!!!
Que delícia começar o domingo com seu poema belíssimo e com seu comentário divertido!!!
Carlos também é meu amigo. Gosto de cumprimentá-lo quando passeio na praia. Mas, desconfio que ele fica ali capturando os sentimentos dos desavisados, como fez a vida toda, para escrever mais poemas, onde estiver!!! Está respondida a sua pergunta, é assim que ele arranca os sentimentos do seu peito. Cuidado!!!! Aliás, nem sei porque te conto isso, já que todo poeta tem essa mania, não é mesmo Adão Flehr????
Existe um mendigo que gosta de sentar ali, colocar o braço sobre o ombro de Carlos e conversar e ler pra ele. É muito engraçado, você já viu???
Beijos saudosos

Lidiane disse...

Meu querido Adão.

Tão bom ler você no domingo.
Já ia reclamar por atualização.
:P

Drummond sempre sempre foi um grande companheiro pra mim. Na infância, com os contos deliciosos da coleção "Para gostar de ler", na adolescência com poemas de amor que me faziam suspirar por vários alguéns que já nem lembro e, adulta, quando descobri em Drummond a voz do lirismo que eu sempre quis ser, ao invés de ter.
De Itabira direto pro meu coração.
E é dele o meu poema preferido de todos os tempos. Aquele que eu leio quando não tenho mais força.
E que eu vou deixar de presente pra você agora, porque eu quero, tanto pra mim, quanto pra você, a vontade de viver sem medos.

Um beijo, Adon queridon.
Procê e pros meninos mais lindos do Rio.

Congresso Internacional do Medo

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que estereliza os abraços.
Não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro
e medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas.
Cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Carlos Drummond de Andrade

Anônimo disse...

Adão,

Acho que já falei para vc que Drummond faz parte do patrimônio sentimental de minha infância.
Vinte anos? É nada para quem é imortal.

Um bom final de domingo!

beijos,
Cris

Anônimo disse...

Sabe que uma das primeiras coisas que farei na próxima vez que estiver no Rio será dar uma esticada até o Arpoador e "cumprimentar" o poeta, sentar ao seu lado, ver o mar bater e me perder em pensamentos!
Quando morava aí eu sempre realizava este ritual!

Você anda bem afiado, né moço? Melhor para nós!

bjs / Léa

Anônimo disse...

Vivas ao nosso poeta maior... e também para você. Adão! Linda homenagem!
Bjs,

Anônimo disse...

Querido,

Eu fico com um verso dele que diz tudo:

"Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão"

Amém.

Anônimo disse...

Adão,

Gostei tanto, tanto do que você escreveu! Parece que arrancou do meu peito o que eu sinto por ele!

Um beijo grande!

Anônimo disse...

Adão,


Ninguém poderia prestar a Drummnod um tributo melhor que o teu. Adorei.

Belíssimo poema!

Repito, enfaticamente: Belíssimo!!!


Abraços, flores, estrelas..


.

Anônimo disse...

Adão,
Tens mistério e um jeito simples, certeiro no sentir.
Lindo tributo.
Obrigado por sua palavras no blog.
Beijos

Anônimo disse...

Adão,

Voce traduz como ninguém o nosso maior poeta.
É sempre bom voltar aqui!
Bjs

Fernanda Passos disse...

Linda homenagem ao poeta do povo, dos amores, do mundo.
Drummond conseguiu expressar de forma única temas díspares. É um de meus preferidos e o poema que escolheste é belíssimo.
Obrigada pela visita.
Todos os dias comento no Mude. Considero o Edson uma figura ímpar, que consegue falar do que sentimos e clama por liberdade. Isso nos une poeticamente.
Um beijo pra vc.
Voltarei para ler teus escritos com mais calma e espero que volte ao Poesia na Veia também.

Anônimo disse...

Adão, apesar de distante, você sabe meu coração sempre pulsa por aqui.
Seus poemas são especialmente tocantes para mim, e esta homenagem ao Drummond está soberba.

Muita Luz p/você.

Naeno disse...

Muito bonito o teu poema. Uma homehagem justa a quem foi, hoje mais que ontem, convicto sou, o maior poeta brasileiro de todos os tempos.

Um abraço
Naeno

Anônimo disse...

Adão,
Drummond foi e é nosso eterno poeta! e sua homenagem está realmente à altura!

Um bom domingo!

Beijos

Anônimo disse...

Изумительная идея, как скоро ожидается публикацию нового материала и вообще стоит ждать ?

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