quarta-feira, 11 de outubro de 2006

Como é que se diz: “- Eu te amo” ?


“Eu acredito que não existem heróis.
A gente pode ter pessoas realmente espetaculares, por exemplo, figuras
espiritualizadas, religiosas, que são grandes modelos para a humanidade, mas na verdade, todo mundo é igual.
Eu não acredito que eu tenha uma verdade a mais. E principalmente a juventude.
Se a juventude cair nesse erro de acreditar que sim, elas inevitavelmente vão acabar descobrindo que o ídolo delas tem os pés de barro.”
(Renato Russo - 1960-1996)
fontes: Site
Legião Urbana
Site Renato Russo

***


Eu me lembro como se tivesse acontecido ontem. Mas já se passaram exatamente dez anos. Era uma sexta-feira. Naquela época, todas as sextas-feiras eram especiais. Éramos tão jovens e tínhamos todo o tempo do mundo. As ilusões não haviam fenecido, e ainda era cedo para nós.

Aproveitamos o dia que prenunciava o final de semana para comemorar, saímos do trabalho com o sol ainda alto, devido ao horário de verão. Fomos para o nosso “bunker” tradicional, um dos inúmeros “pés-sujos” que ladeavam o nosso escritório.

Trabalhávamos duro durante toda a semana, segundo o “Yuppie way of life”, vigente naquele tempo , e buscávamos toda a diversão que algum veneno anti-monotonia pudesse nos proporcionar, nos tempos livres. Éramos seis jovens típicos daquele tempo. Hoje, um tempo perdido.

Discutíamos sobre tudo, desde a mais recente fofoca do escritório até Freud, Jung, Engels e Marx. E apesar de acreditarmos no futuro da nação, havia tanta sujeira nas favelas e no Senado que sempre nos questionávamos: que país seria aquele? O Rio de Janeiro já prenunciava o faroeste caboclo que é hoje, mas ainda ficávamos até mais tarde nas ruas, conversando, bebendo, namorando... tentando descobrir como é que se diz: “ - Eu te amo” !

Lá pelas tantas, a rádio que municiava a música ambiente anunciou uma notícia tão inédita quanto improvável para nós: havia falecido na madrugada de hoje, à 1h, por infecção pulmonar, o cantor, compositor e líder da Legião Urbana, Renato Russo.

Ícone e porta-voz de toda uma geração, da minha geração, Renato foi a voz, o cérebro e o coração de toda uma época. Sabíamos de seu recolhimento e das suspeitas de que ele estivesse com AIDS, mas o lançamento de um novo CD, “A Tempestade”, apesar de tão belo quanto soturno, nos havia dado um novo alento. Mesmo depois de ouvirmos o anúncio de sua morte, custávamos a acreditar. No meu canto, eu repetia internamente: eu não vou chorar, eu não vou chorar... Acho que todos daquela mesa estavam pensando o mesmo, porque ninguém ousava falar palavra sequer. Aos poucos, timidamente, alguns começaram a cantarolar baixinho, a música que estava sendo reproduzida no alto-falante, como se não houvesse amanhã.

A noite acabou e certamente não fugiríamos mais com ele, ficaram as honras e promessas, lembranças e estórias. Enquanto estávamos indo de volta para casa, eu me lembrava de uma frase dele que dizia que não devemos cultuar heróis porque até mesmo estes tem os pés de barro...

Contudo, eu não queria de forma alguma me desfazer de meu herói. Se fosse só sentir saudade, mas tem sempre algo mais e seja como for, mesmo com os seus pés de barro, eu rabisquei um sol na calçada, com a fugacidade de um giz. Ou da própria vida. Mas tudo bem...

19 comentários:

Anônimo disse...

Mas eu chorei! Eu também lembro bem deste dia!
Bela lembrança de um artista maravilhoso que o destino nos levou!

sds / Léa

Anônimo disse...

Adão,

Está sendo bem pouco divulgada esta data nos meios de comunicação.
Para quem viveu esta época como nós, é importante reverenciar a memória e recordar os bons (e maus) momentos que passamos ao som do Renato.

Beijos,
Bia

Anônimo disse...

Lá vem, lá vem, lá vem, acho que estou gostando de alguém... e é de ti... mas tudo bem, tudo bem, tudo bem...

Esta música me traz muitas lembranças, valeu!

bjs,

Anônimo disse...

Caro Adão,
Renato Russo extrapolou os paradigmas como cantor, compositor, músico e ser humano. Como você bem o disse, ele foi o ícone e o porta voz de toda uma geração que ficou orfã, há 10 anos.

Um abraço,

Anônimo disse...

Adão.

Ouvi a Legião minha vida inteira.
De longe, é a minha banda nacional preferida.
Tudo é tão eu...

Hoje estou no clima de Metal contra as Nuvens.

Um beijo pra você com cheiro de "vento no litoral".

Anônimo disse...

Adão,

Eu também me lembro deste dia. ELE foi e é um dos meus maiores ídolos e faz muita falta.

E o seu texto é um dos mais belos que eu já li sobre ELE.

Bom Feriado,

Anônimo disse...

E porque hoje é outro dia, feliz dia das crianças, Adão-menino.

Jôka P. disse...

Não vou chorar...

Anônimo disse...

Um dos meus ídolos.

"Um anjo triste passou perto dele e o levou para a Via Láctea"

Qd eu chegar no céu, quero assistir ao show dele.
Beijo

Anônimo disse...

Oiiiieee, que lindo o que vc escreveu, Adão.
Eu gostava muito da Legião, e lamentei eles terem parado, mas sem o Renato Russo não fazia sentido mesmo.

bjs,

Anônimo disse...

Não gosto de Legião, salvo algumas músicas que ouço na voz de outros interpretes (por que acho que meu problema é com o Renato Russo mesmo), mas gostei do texto, bem nostaugico.. viajei!

Anônimo disse...

Andrea Doria, é uma trilha sonora para um momento especial meu! Bonita homenagem!


Beijinhos,
Lorena

Eliana Tavares disse...

Eu também sinto muita falta dele. Várias de suas músicas marcaram momentos importantes nas nossas vidas, não é mesmo? Mas devemos lembrar que o plano sempre foi ficarmos bem!
Passo sempre por aqui, com prazer. Gosto muito do que leio.
Mudei o modelo, mudo de vez em quando.
Beijos
Eliana

Vera F. disse...

Adão, Renato é da minha geração tbm e fiz a minha homenagem para ele no dia 11, não sei se vc viu?. Ele dizia muitas coisas que gostaria de ter dito ou escrito. Vi um só show dele, mas valeu por muitos.
Seu texto está primoroso e reflete a importância do Renato para todo uma geração.

Bjos.

Bjos.

Anônimo disse...

Adão,
Toda uma geração de ve muito ao Renato e à Legião. Foram os autores de nossa trilha sonora mesmo.
Parabéns pelo excelente texto, viajei também através do tempo.

Abs

Tamara Queiroz disse...

Nossa, eu cliquei nesta tela do comentário e simplesmente uma lágrima rolou do meu olho direito...

... bom, xá prá lá! Eu, realmente, não consigo ser como os outros.

.............
"E quando eu for embora,
Não, não chore por mim."

Então, não chore?!

Anônimo disse...

Ouvi Legião hoje e lembrei de vc.
:)

Van disse...

Tá...
Temos U2, Legião (Renato-chorei tanto, mas tanto no dia em que ele morreu), Moska, Drummond, Quintana, O que sobrou do céu, Calcanhoto...
E tenho certeza de que ainda não acabaram-se as "coincidências"

Você sou eu!!!!!!!!!!!!!!
Alma-gêmea-literário-musical?
Existe isso?

Tá. Ok. Chega de comentar por hoje.
Cansei-te né?
Então, bonna notte!
Durma bem. Fica bem.
Beijuca

Ray disse...

Lindo texto. Acho que resume muito bem. Apesar de ser muito pequena nessa momento, sinto saudades dessa época.
Me segurei para não chorar neste texto, mas me lembrei de "Renato Russo - a peça", os momentos finais da vida dele...
Um grande poeta, um grande músico e uma grande pessoa e alma.
As músicas ainda atuais. Mesmo o poeta não estando por aqui.

Beijos!
Sofie Simons Bardot

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